Cenários sombrios nos esperam – W. Novaes

Washinton Novaes, tenho dito neste espaço  e o repito, é um dos nossos melhores analistas de questões ecológicas que afetam o planeta, a espécie humana e o futuro do projeto civilizatório humano. Não apenas nos  fornece dados seguros. Obriga-nos pensar. Não basta saber, temos que pensar  o que sabemos. Nem toda informação é conheccimento. O conhecimento nasce das conexões coerentes e inteligentes que fazemos,  criando um sentido iluminador a partir das informações oferecidas. É o que faz W. Novaes com serenidade, sentido de gravidade e de urgência. Como membro da Comissão que elaborou a  Carta da Terra,  junto com outros notáveis, animados por M. Gorbachev, venho pessoalmente fazendo uma espécie de ritonello alertando sobre as ameaças que nosso estilo de tratar a Terra e seus escassos bens e serviços, pode estar produzindo para tempos não muito distantes. Estamos em marcha acelerada rumo a uma catástrofe ecológico-social que a própria Terra com os inúmeros eventos extremos nos está despertando. Numa famosa parábola, o filósofo dinamarquês  S. Kirkegaard, conta a história do incêndio de um teatro. Um palhaço fora destacado pelo diretor para convocar os assistentes a virem ajudar a apagar o incêncio. E todos riam e riam, pois achavam que o palhaço estava desempenhando bem a sua missão de entreter as pessoas. Ninguém o tomou a sério. Ocorre que o fogo se espalhou, queimou todo o teatro e com ele toda as pessoas que estavam dentro dele.  Que isso não se  repitra conosco e não reproduzamos os tempos hilariantes da época de Noé que também conclamava para mudar de vida face a um dilúvio que  se aproximava.  Todos riam , se divertiam e não davam atenção às convocações do sábio Noé. W. Novaes segue a mesma lógica: adverte e conclama.  Merece que leiamos o que nos diz e tomemos suas palavras a sério porque a situação é séria. Somos eu e ele pessimistas? Respondo com J. Saramago:”Não somos pessimista; a realidade é que é péssima”: LBoff

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“Quem acompanha no dia a dia o noticiário internacional e nacional da atualidade política, econômica e social não tem como não sentir a sensação de estarmos perdidos em meio a um tiroteio gigantesco, sem vislumbre de um caminho seguro. Por aqui, a impressão, além disso, é de uma corporação política descolada da realidade e da magnitude dos problemas, cuidando apenas dos interesses específicos e imediatos desta ou daquela porção do eleitorado que lhe interessa, para garantir a próxima eleição – quando não se trata mesmo de interesses financeiros pura e simplesmente.

Ainda há poucos dias, o Senado aprovou a criação de mais de 20 novos municípios no país, com populações mínimas de 20 mil habitantes no Sudeste e Sul, 12 mil no Nordeste, 6 mil no Norte e Centro-Oeste. E que ganharão essas novas unidades da Federação que já não pudessem ter como partes de outros municípios ? Simples: participação no Fundo dos Municípios, recursos para obras, talvez para empreiteiras que financiem campanhas eleitorais.

Tudo como sempre, num país que experimenta mudanças vertiginosas – como lembrou em artigo neste jornal (9/3) o ex-ministro Pedro Malan, ao enfatizar que em 60 anos a população brasileira aumentou de 160 milhões de pessoas. Fazem parte desses números assombrosos os futuros 42 milhões das regiões metropolitanas de São Paulo e Rio somadas – mais que toda a população do Canadá de hoje, que não chega a 40 milhões, embora seja o país com o segundo maior território, quase 10 milhões de quilômetros quadrados; tem pouco mais habitantes que a população rural brasileira de hoje, em torno de 30 milhões.

E nós ainda vamos crescer mais, até chegarmos perto de 230 milhões , segundo o IBGE (ESTADO, 30/8/13), e só deixaremos de crescer daí por diante para atingirmos 218,1 milhões em 2060. Mas quem está planejando o futuro de um país que, nesse ano, precisará ter três pessoas trabalhando para sustentar duas crianças e um aposentado ? Quem no mundo político estará pensando que, hoje já temos uma taxa de desemprego entre jovens extremamente alta e que poderá crescer mais ? Quem já planeja calculando que em 2030, em São Paulo, haverá mais idosos (21,4% da população ) que jovens (13,8%) ? Quem pensa, a propósito de idosos, nos absurdos índices de reajuste de aposentadorias para quem recebe mais que salário mínimo – e que vai vendo seus rendimentos decrescerem proporcionalmente de ano para ano, há décadas ? Como viverão esses idosos ? Como ajudarão os jovens ?

Melhor voltar a atenção para o mundo como um todo E lembrar que, segundo a ONU, vamos passar para 9 bilhões de pessoas em 2050, com a maior parte do crescimento populacional nos países menos desenvolvidos. Neles, a imensa maioria estará nos países mais pobres, onde mais aumentará a população (e hoje já há mais de um bilhão de pessoas em pobreza extrema, mais de 800 milhões passando fome, mais de 150 milhões de crianças, segundo a Organização para a Alimentação e a Agricultura – a FAO, da ONU -, com atraso no crescimento; e ainda se passará para 2 bilhões de miseráveis no mundo). Como prover de terras o indispensável crescimento da agricultura de alimentos, com a desertificação aumentando 60 mil quilômetros quadrados por ano ? Onde obter mais água se a agricultura já usa 70% dos recursos disponíveis ? Que fazer com a pecuária, onde esta parte considerável da emissão de metano, que contribui para mudanças do clima ? Levar o mundo a ter um telefone celular por pessoa, quase 50% ligados à internet, em 2014, em nada beneficiará a equação, com três quartos do planeta vivendo em cidades, mas paralisados – como nas metrópoles brasileiras – pelos congestionamentos.

Precisamos com urgência de novas estratégias, modernas, compatíveis com os tempos que teremos de enfrentar. A começar, no Brasil, por uma estratégia que privilegie nossa situação excepcional em termos de recursos naturais, recursos hídricos (mais de 10% do total do planeta), território. Mas uma estratégia que nos leve também a ter planejamento e ações adequados para enfrentar mudanças climáticas, que já provocam eventos problemáticos em mais de metade dos municípios.

Tudo isso exigirá, internamente e no plano global, uma nova ética, que nos conduza a uma nova economia, elimine o desperdício, a desigualdade escandalosa entre países, segmentos sociais, indivíduos. Não bastará confiar em que reduzir a população bastará ou bastaria. A taxa de natalidade brasileira já é inferior à taxa de reposição. Com o aumento da expectativa de vida e o grande número de mulheres em idade fértil, não se encontrará o equilíbrio apenas por aí.

Nada disso, entretanto, parece interessar a nossas campanhas políticas, eleitorais. Onde estão, por exemplo, planejamento e recursos para eliminar nosso escabroso panorama em matéria de saneamento básico, com quase 40% dos brasileiros sem terem suas casas ligadas a redes de esgotos, quase 10% sem água encanada ? Onde está a solução para lixões, onde vão parar pelo menos 50% dos resíduos ? Onde a adequação do sistema de saúde, em todos os níveis ? E a educação ? Não é para isso que se elegem governantes e legisladores ?

E ainda não sabemos como fazer com a perda de valores “tradicionais”, coletivos ou pessoais. Não se trata apenas de saber se eram “válidos” ou não. Mas nada se está colocando no lugar. O coletivo é substituído pela internet, que aponta para necessidades imediatas, específicas, grupais, sem projetos políticos. Os valores individuais simplesmente são trocados pela vontade momentânea dos indivíduos. Como ter projetos políticos coletivos ?

Mas não há como escapar. É fundamental saber que tudo vai mudar no mundo, queira-se ou não, goste-se ou não. “Sei que nada será como antes, amanhã ou depois de amanhã”, já disseram Milton Nascimento e Ronaldo Bastos. É preciso correr”.

Washington Novaes, “Nada será como antes, amanhã e depois de amanhã”: a sair em breve no Estado de São Paulo.

 

 

 

 

 

 

 

8 comentários sobre “Cenários sombrios nos esperam – W. Novaes

  1. Tenho estudado muito sobre o assunto e creio que tem a ver com a Nova Ordem Mundial.Os “donos” do mundo controlam tudo, desde a mídia até o dinheiro. Inclusive a saúde. É fato que é meta deles reduzir a população, porque a Terra não recursos naturais para todos. O Ser humano é uma espécie de gafanhoto, uma praga, que mata e destró o planeta em que vivemos.

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  2. Excelente artigo, esclarecedor e alarmente. Como fazer o nosso povo adquir esta nova mentalidade de saber cuidar, zelar, economizar para obtermos um futuro não tão nefasto.

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  3. A muitos anos acompanho os comentários de W.Novães,e de L.Boff., penso que estas pessoas,tem um vínculo muito grande com nosso criador,acho que tens uma missão,de acordar aqueles que estão adormecidos, pelos bens momentâneos,como os prazeres do consumismo e do conforto,as delícias e efemeridades características da espécie,não tenho a menor dúvida,que nossa terra, chora,ri,se alegra e entristece com nossas ações (L.Boff.) e tenho a certeza que suas missões tanto de L.Boff,e W.Novães.,estão favorecendo muito o nosso planeta,seus habitantes,suas vidas,foi uma dádiva de nosso criador,graças a vocês,muitas mentes se conscientizaram da grave crise ecológica global.,mas como dizem os sábios.:,Tudo tem o seu tempo.,E os tempos, parecem terem chegados.,Abrçs.

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  4. Assim é a vida ! Preocupações como que vai chegar na final ! Quem vai vencer o Big Brother ! A mulher mais linda, a bunda digo banda musical da moda ! O ultimo celular !
    Estamos sem água, pandemia de dengue, violência, desagregação familiar, falencia da saúde, sistema educacional sucateado ! Mas, temos que continuar ! Continuar o que ? Estamos sendo destruidos por forças obscuras ! E dominados por um monstro que se fantasia de Santo ! Mas explicar as pessoas que isto está acontecendo é realmente estar vestido de palhaço ! Mas minha alegria é que tudo está previsto ! Profetizado….

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  5. Caro Boff,

    É sempre prazer ter acesso às suas reflexões.

    Estive no último Cong. de Agroecologia, em Porto Alegre, em novembro de 2013 e tive o prazer de ouvi-lo mencionar a Alfabetização Ecológica. Um tema que trabalho aqui em Sete Lagoas, na Embrapa Milho e Sorgo, como pesquisador em Agroecologia.
    Compartilho a publicação, na perspectiva de ampliar a reflexão sobre o assunto, que a meu ver, torna-se cada dia mais relevante.

    Clique para acessar o doc162.pdf

    um abraço,

    Walter José Rodrigues Matrangolo

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