No seio das trevas atuais, abra-te à Luz do Alto

Depois de semanas de turbulência política, onde dominaram densas trevas feitas de distorções, vontade de destruir e de raivas viscerais, mas felizmente com alguns lampejos de luz, escrevemos esta meditação da Luz. Ela até hoje é para os cosmólogos um mistério ainda indecifrável. Só a entendemos um pouco pensando-a ora como onda ora como partícula.

Independentemente desta imponderabilidade sobre a natureza da Luz, professamos a crença inarredável de que a Luz tem mais direito do que as trevas. Basta a pequena luz de um fósforo aceso para espancar a escuridão de toda uma sala.

Foi o que nos moveu a publicar, recata e reverentemente, esta pequena reflexão inspirada pela prática dos cristãos do norte do Egito, influenciados pela cultura gnóstica da época mas assimilada dentro da compreensão cristã que via na Luz a presença do Espírito Criador.

Do fundo mais profundo do universo nos vem uma Luz misteriosa. Ela incide sobre a nossa cabeça, exatamente onde temos o corpo caloso, aquela parte que separa o cérebro esquerdo do direito. Essa separação é a fonte de nossas dualidades, por um lado o sentimento e por outro o pensamento, por um lado a capacidade de análise e por outro nossa capacidade de síntese, por um lado o senso de objetividade e por outro, da subjetividade, por um lado o mundo dos fins e por outro o universo do sentido e da espiritualidade.

A Luz beatíssima do Alto suspende a separação dos cérebros e opera a união. Pensamos amando e amamos pensando. Trabalhamos fazendo poemas. Combinamos arte com lazer. Mas sob uma condição, a de nos abrirmo-nos totalmente à Luz do Alto.

“Acolha a Luz misteriosa que atravessa todo o universo e chega até a ti! Faça-a correr por todo o teu corpo, pela cabeça, pelos olhos, pelos pulmões, pelo coração, pelos intestinos, por teus órgãos genitais. Faça-a descer pelas pernas, detenha-a nos joelhos, e, por um momento, fixe-a nos pés, pois são eles que te sustentam”.

“E suba com ela, passando por todo o corpo, dirija-a novamente ao coração para que de lá te venham o bons sentimentos de amor e de compaixão. Faça-a ascender até ao meio da testa, àquilo que chamamos de o terceiro olho. Ela lhe trará pensamentos luminosos. Por fim deixe-a repousar no alto da cabeça”.

“De lá ela encherá de luz todo teu corpo. Ela abrir-se-á a todo o universo, conferindo-te a sensação de seres um com o Todo. Superar-se-ão as dualidades e farás a experiência bem-aventurada da unidade originária de tudo o que existe e vive. E conhecerás uma paz que é a integração das partes no Todo e do Todo nas partes. E de ti sairá uma luz como aquela do primeiro momento da criação. Conhecerás, mesmo que seja por um momento, o que é ser feliz em plenitude”.

“Por fim, agradeça a presença transformadora da Luz do Alto. Deixe-a sair para o seio do Mistério de onde veio”.

“No entanto, escute este conselho. Prepara-te sempre para acolhe-la. Pois ela nunca deixa de vir. E se não tiveres aberto todo o teu ser, ela passa ao largo e tu, estranhamente, te sentirás vazio, com um sentimento de falta de rumo e de sentido”.

“Sempre que acolheres a Luz beatíssima, irradiarás bondade e benquerença. E todos se sentirão bem junto de ti.”

“Abra-te inteiramente à Luz até tu mesmo virares plena luz”.

Leonardo Boff escreveu Meditação da Luz. O caminho da simplicidade, Vozes 2012.

7 comentários sobre “No seio das trevas atuais, abra-te à Luz do Alto

  1. Parabéns abençoado Leonardo! Este artigo é um dos mais lindos que já tive o privilégio de ler! Bravo!!!

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  2. Maravilhosa reflexão e ao mesmo tempo um exercício meditativo…Num momento em que precisamos muito para não perdermos o centro, a fonte que nos abastece. Obrigada, Leonardo !

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  3. Meu grande irmão, Leonardo: quero expressar aqui a minha gratidão e a alegria de poder compartilhar no meu blog – como faço repetidamente com o que escreves – essa profunda meditação da Luz. Você acertou quando a partilhou com todos os que leem o seu blog no mundo inteiro, mas especialmente conosco, os brasileiros aturdidos por essa treva política e institucional insuportável, que estamos passando. Chegará o dia de acendermos um fósforo que seja – e pedimos ao Senhor da Luz que a faça chegar em breve – pois sabemos que as trapalhadas desse governo interino só têm de bom as lições que o povo está reconhecendo de que precisamos continuar a manter e a defender – mesmo se capengas – as instituições democráticas do pais.

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  4. Caro Leonardo. Já fiz um comentário sobre este teu artigo sobre a Luz. No entanto, gostaria de voltar a comentá-lo com uma observação para a tradução em italiano do mesmo artigo que, infelizmente, saltou uma parte do terceiro parágrafo que segue:

    Foi o que nos moveu a publicar, recata e reverentemente, esta pequena reflexão inspirada pela prática dos cristãos do norte do Egito, influenciados pela cultura gnóstica da época mas assimilada dentro da compreensão cristã que via na Luz a presença do Espírito Criador.

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